EM QUE MEDIDA A INFORMAÇÃO NA SOCIEDADE VIRTUAL CONTRIBUI À CONTENÇÃO DE VÍCIOS NO CAPITALISMO TENDO-SE COMO PARADIGMA A REALIDADE ESTADUNIDENSE E A BRASILEIRA

JULIANO MANICA

Abstract


OBJETIVOS DO TRABALHO:

 

O trabalho desenvolvido tem por objetivo refletir em que medida a informação de qualidade, no ambiente moderno da sociedade virtual, pode contribuir a conter vícios presentes no ou do capitalismo, tendo-se por base a experiência estadunidense. Pretendeu-se demonstrar que a realidade norte americana pode servir de paradigma à brasileira, com proposições para o devido enfrentamento.

 

METODOLOGIA UTILIZADA:

 

O método aplicado à pesquisa realizada foi o bibliográfico selecionado, com abordagem qualitativa. Partindo de algumas premissas estruturadas de maneira lógica e racional, o autor pretendeu contribuir com destaque acerca do problema e soluções possíveis com vista ao aperfeiçoamento do capitalismo através da informação inclusiva e de qualidade junto ao ambiente da sociedade virtual.

 

REVISÃO DE LITERATURA:

 

Apercebe-se que o capitalismo, ontem e hoje, mesmo nos EUA quanto no Brasil, possui vícios a serem continua e regularmente contidos, a bem do povo.

E, que o desenvolvimento da ciência, encurtamento das distâncias, aumento da velocidade e instantaneidade da informação, assim como globalização, acabou por gerar uma sociedade virtual. Esta, sem nome, ou fronteiras, hinos e bandeiras, cor, orientação sexual, idade, idioma, etc., mas com uma identidade. Daí a importância da informação e de seu acesso descomplicado e qualificado.

Estes foram os fios condutores do presente ensaio. O sistema econômico moderno fixa responsabilidades e recompensas. Vale-se, normalmente, do emprego, do dinheiro e do prestígio. Quanto ao último, antes pelo nascimento, e por agora mérito, que pode se apoiar no sistema de mercado em razão da dificuldade de manipulação e da busca pela eficiência. Em tese, a democracia não dialoga com a meritocracia, eis que por regra a maioria não faz por merecer. 

Mas, com foco no mundo capitalista e no seu expoente: a sociedade norte americana, e também em boa medida a brasileira, vale-se da meritocracia. Lá, mais propriamente, pela cultura de sua legitimidade e pela distribuição de benefícios em quantidade e alcance que satisfaçam a maioria. Aqui, idem, porém mais por aproximação e influência estadunidense do que por uma meritocracia consolidada. Enquanto a Europa e o Japão priorizaram direitos de nascença, a Índia o de castas, e a Inglaterra o poder aristocrático, e a Revolução Francesa centrou na liberdade, na fraternidade, e na igualdade: esta última de resultados, de outra banda e no que aqui interessa ao estudo, a Revolução Americana (séc XVIII, que culminou na Independência) propôs a superação da imobilidade social pela liberdade e pela igualdade, esta última, note-se bem: de oportunidades, ao passo que o sucesso econômico americano que se seguiu consolidou naquele país a meritocracia. Aliás, nos EUA, em pesquisa recente, apenas 1/3 do povo reputa ao Estado reduzir a desigualdade de renda enquanto 70% afirma ser dever do Estado garantir a igualdade de oportunidades (ZINGALES, 2015).

E a meritocracia é ameaçada pelo compadrio político, onde os benefícios são redistribuídos pelo interesse, e no ambiente empresarial onde exista monopólio por meio da lealdade e estrutura de poder, gerando desigualdades e de renda. Contudo, o sistema de livre mercado e a concorrência garantem a competição e a sobrevivência do mercado, ao passo que o acesso à informação de qualidade pode conduzir à inclusão e à melhor participação e à fiscalização social.

O direito à transparência e à informação pública é fundamento ao Estado Democrático de Direito. E para sua eficácia no Brasil a Lei nº 12.527/2011 regula o procedimento de acesso às informações públicas, estabelecendo prazos, sanções e formalidades ao trâmite administrativo. Mais, o Marco Civil da Internet - Lei nº 12.965/2014, estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet, além de determinar diretrizes de atuação dos entes federativos: União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. Esses normativos impulsionam toda pessoa a coparticipar da gestão pública e garantem o respeito aos direitos da personalidade. O marco regulatório garante o acesso aos dados públicos e maior debate social das políticas públicas. Nesse espectro, ao menos no ambiente público e no que afeta ao mercado e à economia, o vício reside na falta de qualidade das informações e na deficiência do acesso, por dados ininteligíveis ou parciais e confusos. Não basta um portal titulado como “da transparência”, é preciso ser realmente transparente, simples, acessível. As novas tecnologias e a globalização sugerem exatamente a cibertransparência, e exige que a informação seja clara, completa e eficiente, enfim de qualidade.

Ampliou-se, assim a accountability democrática. É que o obscuro e o sigilo favorecem o arbítrio e o favoritismo, e o poder e a transparência não são aliados, sem olvidar do Poder Invisível retratado por Norberto Bobbio (VORONIUK, 2018). Daí porque os sites oficiais de órgãos e agências reguladoras do mercado e da economia, precisam ser de fácil acesso e de forma a disponibilizar a todos informações claras, objetivas, concisas, precisas e completas. Desde o Banco Central (Bacen), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), até as agências como a Telecomunicações (Anatel), de Petróleo (ANP), de Energia Elétrica (Aneel), de Saúde Suplementar (ANS), de Vigilância Sanitária (Anvisa), de Águas (Ana), de Transportes Aquaviários (Antaq), dos Transportes Terrestres (ANTT), de Aviação Civil (Anac), etc., devem primar pela transparência e boa informação.

É que a globalização aumenta ainda mais a potencialidade de distorções e desigualdades. No mercado global a produtividade empresarial aumenta enquanto os salários tendem a se estagnarem, e há que se garantir tanto o trabalho digno quanto a dignidade dos que já trabalham e daqueles que ainda aguardam a inclusão. No capitalismo, os jovens adultos ascendem socialmente através do ideário do trabalho e de oportunidade. Mas dados estatísticos dos EUA sobre a mobilidade intrageracional, onde se espera que 30% de cada 1/5 da pirâmide social ascenda a um nível superior a cada 10 anos, e acerca da mobilidade intergeracional, sob a ótica entre pais e filhos e sua ascendência social, vem apontando um declínio, em especial nas camadas mais baixas da pirâmide social, a ponto de se concluir que, ao menos quanto aos EUA: osbenefícios da meritocracia estão reduzindo tanto em volume e alcance ao tempo que cresce a distorção por interesses não republicanos; sendo que este sintoma social é visto pela frustração e pessimismo no sistema (ZINGALES, 2015). E o que pensar acerca da realidade brasileira? Parece estar a ocorrer o mesmo.

O capitalismo convive com a desigualdade de renda. E o livre mercado possibilita a desigualdade não excessiva, que beneficie a todos, e seja entendida como justificada. Vale-se, mesmo, da concorrência entre quem oferece o produto ou serviço e a liberdade de escolha pelo consumidor. E, utiliza-se do processo político em caso de concentração de poder de mercado. O problema surge quando o poder de mercado e o político são centralizados, afastando-se a concorrência e a liberdade e criando o favoritismo. A concorrência é benéfica, pois induz a inovação e o desenvolvimento, reduz o preço e a discriminação, e amplia a liberdade, assim como medidas antitruste agem em defesa da concorrência, contribuindo a conter o ímpeto do poder político das empresas. O compadrio, a partir da ideia do nepotismo e sua origem histórica com passagens pela igreja Católica, corrompe o ambiente empresarial e a economia. À medida que as empresas concentram poder de mercado, menor a concorrência e maior a distorção, bem assim quando aproximados o poder de mercado e o político então os interesses escusos ou pessoais agem com maior e perigosa força.

Sem embargo da realidade brasileira, nos EUA o compadrio no ambiente financeiro ganhou amplitude, colocando em risco a concorrência. Isto sem deixar de destacar a igual presença da fraude corporativa nos ambientes de mercado. O acesso às finanças deve ser generalizado, a empoderar as ideias e a criar condições à igualdade de oportunidades. E as companhias precisam ser auditáveis com eficiência. Porém crises no sistema financeiro têm prejudicado a economia e o mercado, bastando lembrar a de 2008, originada nos EUA por “bolha imobiliária” decorrente do aumento de valores imobiliários, que impactou o mundo capitalista, não escapando o Brasil. Os EUA historicamente se preocupam em equilibrar as forças de mercado, pró consumidores, e no setor das falências busca prevenir abusos e estimular a mantença do equilíbrio do mercado e economia. A ideia é do equilíbrio, como conceito de difícil exatidão, que visa impedir processos oportunistas e ajudar os que de fato precisam e merecem auxílio estatal para soerguimento. Falando sobre os bancos e aqueles grandes demais para falir, reflete-se sobre a assunção intencional a riscos maiores por tais bancos, diante de um cenário garantidor pelo Estado. Aliás, em 2008, quando os EUA não salvaram duas grandes instituições (Lechman Brothers e Washington Mutual), gerou-se espanto e efeito negativo ainda maior na economia (ZINGALES, 2015). Aqui, acresço parênteses do momento: o caso da Evergrande Group, incorporador imobiliário chinês com dívida bilionária, estando o governo daquele país reticente como agir: salvar a empresa grande demais-para-falir, ou enfrentar riscos e prejuízos inimagináveis se vir a falir. O que se fazer, a bem da mantença da concorrência e do melhor interesse social?

Nesse ponto, a consolidação do sistema bancário impede o surgimento ou desenvolvimento de outros mercados organizados de sustentação financeira. O sistema financeiro passou a crescer muitíssimo após 1950, subindo de 2,9% a 8% do PIB até 2007, elevando lucros e salários. E quando esses profissionais ocupam cargos destacados no governo, surge risco de que coincida interesses do país com os da indústria, advindo políticas públicas ruinosas, desconfiança no governo e nas instituições e o populismo. Nos EUA a era dourada foi o pós Guerra (50-70), com a democracia, alta escolaridade, e segurança para a produção, gerando oportunidade de desenvolvimento sustentável (ZINGALES, 2015). Mas outros países, como o Brasil, também melhor se estruturam e se desenvolveram, de modo a existir uma concorrência dos EUA e outros países.

Neste crescente evolutivo histórico internacional houve a revolução das telecomunicações (aqui em especial, a internet) e a instalação da sociedade virtual. Que, pode interferir ativamente para a mantença do livre mercado e concorrência. Está havendo perda de renda do trabalhador. Enquanto a produtividade sobe, o salário abaixa, gerando sentimento de injustiça e de enfraquecimento do livre mercado, a favorecer o compadrio. A solução perpassa a concorrência e o livre mercado, pela educação (igualar pontos de partida e seletividade dos docentes), e rede de segurança (diminuir endividamento pessoal, nos EUA: admite-se falência de pessoa natural, com prazo certo, e seguro desemprego). É que a concorrência combate a desigualdade, enquanto subsídios, o fator psicológico (empresa se utiliza da inocência ou descuido do consumidor na renovação de serviços), as práticas predatórias e o desperdício social mantêm o statu quo. Aqui a economia da informação, com informação de qualidade, LGPD, digitais plataformas e o acesso de qualidade podem ajudar. Sugere-se a ética com base no mercado: familismo amoral, o envolvimento cívico para o desenvolvimento da coletividade. Lembrando Adam Smith, que fala que a busca individual pelos interesses próprios leva ao bem comum, chega-se à importância da confiança: confiança poupadora, pessoal e generalizada. É que quanto maior o valor cívico mais forte será a economia, advindos de episódios particulares de cooperação, reiterados e lentos (ZINGALES, 2015).

O agir de cada qual é impulsionado pelas novas tecnologias, empoderando Citando Jürgen Habermas (obra Entre Facticidade e Validade), e Joshua Cohen, confere-se um poder de maior participação das pessoas no espaço público visando democracia deliberativa. A expressão “sociedade da informação”, com suporte em Sally Burch, surgiu no livro “O advento da sociedade pós-industrial”, de Daniel Bell, em 1973. E, na contemporaneidade, desenvolveu-se na globalização neoliberal e visa o mercado autorregulado (VORONIUK, 2018).

Para tanto, há que se limitar a prática do lobby, que em tese deve ser uma solicitação para melhoria ou aperfeiçoamento de algo, mas na prática tem sido a defesa de ponto de vista com interesse econômico, pró-negócio, podendo operar como forma de corrupção legalizada. A informação e a comunicação são ferramentas para diminuição do lado prejudicial do lobby, destacando-se a função da imprensa e da academia. E, sugere-se simplificar leis e regulações, dizendo que o uso da exceção no ordenamento é perigoso, pois estimula o lobismo, assim como a tolerância zero na ordenação dos comportamentos e interesses, e a perenidade da regulamentação. Aqui os impostos têm funções de arrecadação, moldar incentivos, e redistribuição de renda. O imposto é um mal necessário, para mantença do Estado e dos interesses públicos essenciais. Dizse haver impostos ruins: como de renda (diminui o trabalho) e bons (como sobre cigarro), com dados estatísticos da redução de certo tributo nos EUA a causar um aumento na arrecadação e demonstrar a ineficiênciad daquela tributação. O imposto é bom se eficaz. Sugere-se a abolição ao subsídio (ZINGALES, 2015).

Conhecimento é poder e o povo o alcança pelo acesso à informação de qualidade. Nesse prumo, a web, conjuntamente com a imprensa, concentra poder inato e pode servir de ferramenta de controle aos vícios retratados. Com suporte em Norberto Bobbio, Jürgen Habermas e Hannah Arendt, entre outros, afirma-se que a transparência fundamenta o Estado Democrático de Direito, servindo o acesso à informação de qualidade na sociedade virtual para a diminuição da ineficiência, do arbítrio, desvios, da imunidade do poder. E acresço: do compadrio e do lobismo. Quanto às novas tecnologias de informação e comunicação para um Estado transparente, baseando-se em Manuel Castells, Marcos Nobre, Eugênio Bucci, dentre outros, afirma-se que o mundo ciber passou a fazer parte do jurídico e que a cibertransparência envolve a administração pública e o povo, aí enfeixando o empresário. Dados públicos] veiculados em linguagem excessivamente técnica e deliberadamente incompleta, não propiciam o exercício pleno do direito à informação e à cidadania. (VORONIUK, 2018). A fomentar, este estado de coisas, o favoritismo, o lobismo, a confusão entre interesses públicos e privados, o compadrio, fraudes e crises em ambiente vicioso generalizado, que teimam macular a concorrência e o livre mercado, em demérito ao bastião da igualdade de oportunidades. Daí porque se destacar a sociedade virtual, a cibertransparência e a accontability.

 

RESULTADOS OBTIDOS OU ESPERADOS

 

O presente estudo da realidade norte americana em cotejo à brasileira procura abordar vícios presentes no capitalismo moderno. E, ante aos fenômenos da globalização e da sociedade virtual e da preocupação com a ética, em especial empresarial. Propõe-se refletir sobre o incentivo e a aplicação do uso eficiente da informação de qualidade no auxílio da contenção desses desvios. Assim convém para a mantença do equilíbrio entre os poderes econômico e político, à saudável concorrência e livre mercado, com eixo na igualdade de oportunidades.


References


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

VORONIUK, Cláudia Regina. O direito personalíssimo à informação pública na sociedade brasileira: acesso, qualidade e efetivação. Dissertação. UniCesumar. Maringá, 184 páginas. Último acesso em 27/9/2021: http://rdu.unicesumar.edu.br/handle/123456789/1004. 2018.

ZINGALES, Luigi. Um capitalismo para o povo: reencontrando a chave da prosperidade americana. São Paulo: BEI Comunicação, 2015.




DOI: http://dx.doi.org/10.21902/RevPercurso.2316-7521.v3i41.5530

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PERCURSO, e-ISSN: 2316-7521

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