A DISTANÁSIA JUDICIAL DE EMPRESAS: UMA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO JUDICIAL NOS PROCESSOS DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

Valcir GASSEN, Henrique Ribeiro CARDOSO, José Leite dos SANTOS NETO

Resumo


Objetivos: Este trabalho tem por objeto a análise do comportamento decisório de juízes que atuam em varas empresariais, em que se constata uma regularidade decisória na negativa de direitos dos credores de empresas em recuperação judicial (Lei nº 11.101/2005). Mais precisamente, investiga fatores extrajurídicos nos entendimentos judiciais de: (1) prorrogação do prazo de suspensão de ações de execução (stay period) além do 180 dias em prejuízo do universo de credores privados; (2) homologação de plano de recuperação judicial dispensando-se a exigência de regularidade fiscal, com prejuízo dos credores públicos.

Metodologia: Para tal pesquisou os elementos empíricos na forma de incentivos, condicionantes e constrangimentos sob perspectivas teóricas das ciências políticas, notadamente os modelos de comportamento judicial jurídico, atitudinal e estratégico. A metodologia utilizada foi de entrevistas qualitativas a magistrados de varas empresariais para, de maneira indutiva, testar empiricamente esses modelos.

Resultados: Verificou-se que o desenho jurídico dessa lei se ressente da explicitação do conceito jurídico de recuperabilidade da empresa. Isso permite: (a) o afastamento ideológico dos direitos de credores; (b) uma crença sincera e equivocada de que a única finalidade da lei é recuperar empresas, o que acarreta uma hiperbólica proteção de empresas inviáveis, aqui chamada de “distanásia judicial de empresas”.

Contribuições: A comprovação empírica da deficiência do desenho da lei, com as duas consequências decorrentes disso, permite discutir modificação legislativa para reduzir a discricionariedade desses juízes e obrigar a decretação de falências de empresas inviáveis.

Palavras-chave: Empresas. Direito dos credores. Modelos de comportamento judicial. Lei de recuperação de empresas e falências

Abstract

Objectives: The purpose of this article is to analyze the decision-making behavior of judges who judge bankruptcy cases. Decisions that deny creditors' rights in bankruptcy proceedings are studied (Law nº 11.101/2005). More precisely, it investigates extrajudicial factors in judicial understandings of: (1) extension of the stay period for enforcement actions (stay period) beyond 180 days to the detriment of the universe of private creditors; (2) ratification of the judicial reorganization plan, waiving the requirement of fiscal regularity, with prejudice to public creditors.

Methodology: To this end, empirical elements were researched in the form of incentives, constraints and conditioning under theoretical perspectives of political sciences, notably the models of legal, attitudinal and strategic judicial behavior. The methodology applied was qualitative interviews with judges of bankruptcy courts to, inductively, test these models empirically.

Results: It is concluded that the legal design of this law requires a clearer concept of economic viability of companies. Without this clear concept, it is permissible: (a) the denial of creditors' rights for ideological reasons; (b) a sincere and mistaken belief that the only purpose of the law is to reorganize companies, which leads to a hyperbolic protection of unviable companies, here called “judicial dysthanasia of companies”.

Contributions: The evidence of the deficiency in the design of the law, with the two consequences arising from it, allows discussing legislative modification to reduce the discretion of these judges and force the declaration of bankruptcy of unviable companies.

Keywords: Companies; Creditors' rights; Models of judicial behavior; Bankruptcy and insolvency system; Bankruptcy Law; Plan of reorganization.

 


Palavras-chave


Empresas; Direito dos credores; Modelos de comportamento judicial; Lei de recuperação de empresas e falências

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DOI: http://dx.doi.org/10.26668/revistajur.2316-753X.v5i72.6257

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