A EPISTEMOLOGIA DE FRONTEIRA NA MÍSTICA DA SOBREVIVÊNCIA DE CAROLINA MARIA DE JESUS
Abstract
O presente artigo analisa a obra Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus, a partir das perspectivas da epistemologia de fronteira e da mística da sobrevivência. Discutem-se as contribuições da autora para uma epistemologia contra-hegemônica que valorize os saberes subalternos. Na análise, articulam-se os conceitos de fronteira epistêmica, locus de enunciação, mística da sobrevivência e validação do conhecimento. O artigo apresenta sua trajetória e obra apontando as tensões que sua escrita provoca nas estruturas dominantes do conhecimento a partir da produção de saberes literários desde o espaço negado das favelas, onde, com as lentes por Maria Zambrano, é possível identificar a manifestação de uma mística da sobrevivência. O trabalho conclui que Carolina lega um aprendizado sobre a legitimidade dos saberes que brotam da vida concreta e da luta cotidiana dos oprimidos. Sua existência e obra já representam em si a expressão de uma mística da sobrevivência e a validação de uma epistemologia de fronteira.
Palavras-chave: Epistemologia; Mística; Quarto de Despejo; Carolina Maria de Jesus.
ABSTRACT
This article analyzes the work "Quarto de Despejo" by Carolina Maria de Jesus from the perspectives of border epistemology and the mystique of survival. It discusses the author's contributions to a counter-hegemonic epistemology that values subaltern knowledge. The analysis articulates the concepts of epistemic border, locus of enunciation, mystique of survival, and validation of knowledge. The article presents her trajectory and work, highlighting the tensions her writing provokes in dominant knowledge structures through the production of literary knowledge from the denied space of favelas, where, through the lens of Maria Zambrano, it is possible to identify the manifestation of a mystique of survival. The work concludes that Carolina leaves a lesson about the legitimacy of knowledge stemming from concrete life and the daily struggle of the oppressed. Her existence and work inherently represent an expression of a mystique of survival and the validation of a border epistemology.
Keywords: Epistemology; Mystic; Quarto de Despejo; Carolina Maria de Jesus.
Keywords
Full Text:
PDF (Português (Brasil))References
ANZALDUA, G. La conciencia de la mestiza: rumo a uma nova consciência. Rev. Estud. Fem., Florianópolis, v. 13, n. 3, p. 704-719, dez. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2005000300015&lng=en&nrm=iso Acesso em 15 maio 2023. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2005000300015
BERNARDINO-COSTA, J.; GROSFOGUEL, R.. Decolonialidade e perspectiva negra. Sociedade e Estado, v. 31, n. 1, p. 15–24, jan. 2016.
BOMBASSARO, L. As Fronteiras da Epistemologia Petrópolis: Vozes, 1992
BINGEMER, M.C.L. Escrever como missão, uma literatura em direção à mística. Entrevista de Maria Clara Bingemer a Ricardo Machado. Revista do Instituto Humanitas Unisinos, IUH online, edição 547, 05 abr. 2021. Disponível em: https://www.ihuonline.unisinos.br/artigo/7754-escrever-como-missao-uma- literatura-em-direcao-a-mistica. Acesso em 21 out. 2023.
CHAVES, C. Rituais da Mística. A mística do MST e as aporias da ação coletiva. Revista de Antropologia.
COSTA, JÚNIOR, Josias. A dimensão religiosa na obra Quarto de despejo. Estudos de Religião, 34(3), 2020.
DAVIS, A. (2016). Mulheres, raça e classe. (H. R. Candiani, Trad.). São Paulo: Boitempo
DUSSEL, E. Transmodernidade e interculturalidade: interpretação a partir da filosofia da libertação. Soc. Estado., Brasília, v. 31, n. 1, p. 51-73, abr. 2016. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69922016000100051&lng=en&nrm=iso. Acesso em 15 maio 2023. https://doi.org/10.1590/S0102-69922016000100004ECO
ESCOBAR, A. Sentipensar con la tierra. Nuevas lecturas sobre desarrollo, territorio y diferencia. Medellín: Ediciones UNAULA, 2014. 184 p. (Colección Pensamiento vivo)
FANON, Frantz. Os Condenados da Terra. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005. FERREIRA, Manuel
FALS BORDA, O. Sentipensante. Entrevista. Entrevista com o autor. 2008. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LbJWqetRuMo. Acessado em: 20.08.2023.
FELIPPE, C. Quarto de despejo: o sistema requentado decifrado por Carolina Maria de Jesus. In: SANTOS, M. A. Trazendo Carolina Maria de Jesus para o Direito. Rio de Janeiro: OAB/RJ. 2023.
FERNANDEZ, R. Entrevista com Audálio Dantas. Scripta, Belo Horizonte, v. 18, n.35, p.305-314, 2º sem., 2014.
FERNANDEZ, R. Literatura diarística versus diário literário Nos manuscritos de Carolina Maria de Jesus. In: SILVA, S. A. (Org). A cor e a fome de um quarto de despejo: 60 anos da obra de Carolina Maria de Jesus. Catu: Bordô-Grená, 2021.
FRANCISCO, Papa. Evangelii gaudium: exortação apostólica sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. Cidade do Vaticano: Tipografia Vaticana, 2013. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html. Acessado em: 22.08.2023.
GALEANO, Eduardo. El libro de los abrazos. Madrid: Editorial siglo XXI, 1993.
GLISSANT, Édoardo. Introdução a Uma Poética aa Diversidade. Tradutor: Elenice Albergaria Rocha. Juiz de Fora: UFJF. 2001. 176 p.
HANSEN, M. Os laços que unem Clarice e Carolina. In: Quatro cinco um. A revista dos livros da Folha de São Paulo[online] , 01ago2020. Disponível em: https://www.quatrocincoum.com.br/br/artigos/literatura/os-lacos-que-unem-clarice-e-carolina. Acesso em 21 out. 2023.
JESUS, C. M. Diário de Bitita. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1986.
JESUS, C. Quarto de despejo – diário de uma favelada. São Paulo: Ática. 2020. 264 p.
JESUS, Carolina Maria de. Antologia Pessoal. Org. José Carlos Sebe Bom Meihy. Revisão: Armando Freitas Filho. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1996.
KOIRA, E. I. Desde “el bosque simbólico” hacia la representación mítica del mal. Una lectura de Visión de los hijos del mal de Miguel Ángel Bustos. Teoliterária: São Paulo v.3 n.6. 2013. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/teoliteraria/article/view/22847/16533. Acesso em 15 de maio de 2023. https://doi.org/10.19143/2236-9937.2016v3n6p47-63.
LEFORT, C; CASTORIADIS, C; MORIN, E. Maio de 68 – A brecha. Tradução: Anderson Lima da Silva & Martha Coletto Costa. São Paulo: Autonomia Leterária. 2018. 288p.
LIMA, S. M. O espaço social da voz: preconceito e literatura. In: DALCASTAGNÈ, R.; THOMAZ, P. C. (Org.). Pelas margens: representação na narrativa contemporânea. Vinhedo: Editora Horizonte, 2011, p. 101.
MARCONI, M. D. A. LAKATOS. E. M. Editora Atlas S.A. Fundamentos de Metodologia Científica. 5. ed. SÃO PAULO, 2003. 311p.
MIGNOLO, W. D. Desobediencia epistémica. Retórica de la modernidad, lógica de la colonialidad y gramática de la descolonialidad. Buenos Aires: Ediciones del Signo, 2010.
OLIVEIRA, A. Gramática de Carolina de Jesus serve para marcar o racismo na literatura. Folha de São Paulo. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2021/08/gramatica-de-carolina-de-jesus-serve-para-marcar-o-racismo-na-literatura.shtml. Publicado em: 20.08.2021. Acessado em 12.08.2023.
OLIVEIRA, D. B. GOMES, R. C. Educação e Filosofia, Uberlândia, v. 35, n. 74, p. 643-677, maio/ago. 2021. Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/EducacaoFilosofia/article/view/55175/32878 . Acesso em 15 maio 2023. http://doi.org/10.14393/REVEDFIL.v35n74a2021-55175
OLIVEIRA, É. S.. O Pensamento de Fronteira de Carolina Maria de Jesus. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 40, p. e212106, 2020.
PANIKKAR, R. Da mística. Experiência plena da vida. Barcelona: Herder, 2005
PENTEADO, G. A árvore Carolina Maria de Jesus: uma literatura vista de longe. Estudos de literatura brasileira contemporânea, n.49, p.19-32, set./dez.2016.
PROSPERO, C. As polêmicas na nova edição de “Casa de Alvenaria”, de Carolina Maria de Jesus. Homo Literatus. Publicado em: 27 de setembro de 2021. Disponível em: https://homoliteratus.com/as-polemicas-na-nova-edicao-de-casa-de-alvenaria-de-carolina-maria-de-jesus. Acessado em: 16.08.2023.
REBINSKI, L. Novas edições reacendem polêmicas sobre Carolina Maria de Jesus. Rascunho: O Jornal de Literatura do Brasil. 05.09.2021. Disponível em: https://rascunho.com.br/noticias/novas-edicoes-reascendem-polemicas-sobre-carolina-maria-de-jesus. Acessado em 16.08.2023.
SANTOS, L. C., CARVALHO, A. B., AMARAL, J. G., BORGES, L. A., & MAYORGA, C. (2016). Gênero, feminismo e psicologia social no Brasil: Análise da Revista Psicologia & Sociedade. Psicologia & Sociedade, 28(3), 589-603.
SANTOS, V. S. M. Carolina Maria de Jesus: Outra Epistemologia na Primeira Pessoa.. In: Anais da Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Tecnológica, Artística e Cultural.Rio de Janeiro(RJ) UFRJ, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/jgmictac/319554-CAROLINA-MARIA-DE-JESUS--OUTRA-EPISTEMOLOGIA-NA-PRIMEIRA-PESSOA. Acesso em: 13/08/2023 14:45.
SILVA, S. A. (Org). A cor e a fome de um quarto de despejo: 60 anos da obra de Carolina. Catu: Bordô-Grená, 2021.
SOUZA-LIMA, J. E.; KOSOP, R. J. C. Giro Decolonial e o Direito: Para Além de Amarras Coloniais. Revista Direito e Praxis. Rio de Janeiro, V.10, N.4, 2019, p. 2596-2619.
WITTGENSTEIN, L. (1921, 1994). Tractatus Logico-Philosophicus. São Paulo: EdUSP, p.281.
ZAMBRANO, M. Clareiras do Bosque. Tradução: José Bento. Rio de Janeiro: Relógio D’agua. 1995. 169 p.
ZAMBRANO, Maria. Filosofia y Poesia. 4ª Edição. México: Fondo de Cultura Económica. 1996.
ZAMBRANO, M. Hacia um saber sobre el alma. Buenos Aires: Losada. 2005.
ZAMBRANO, M. El hombre y lo divino. 2ª Edição. 6ª Impressão. México: Fondo de Cultura Económica. 2012
DOI: http://dx.doi.org/10.21902/RevPercurso.2316-7521.v1i46.6984
Refbacks
- There are currently no refbacks.
PERCURSO, e-ISSN: 2316-7521
Rua Chile, 1678, Rebouças, Curitiba/PR (Brasil). CEP 80.220-181