A EXTRAFISCALIDADE COMO INSTRUMENTO DE TRIBUTAÇÃO PARA O CUSTEIO DAS CIDADES INTELIGENTES
Resumo
O escopo do presente trabalho consiste na apresentação da extrafiscalidade como instrumento de tributação para o custeio das cidades inteligentes.
Desta maneira, em um primeiro momento, se faz necessária a análise de aspectos gerais sobre as smart cities, através da apresentação de conceitos, elementos caracterizadores e exemplos concretos de cidades inteligentes localizadas no Brasil e no mundo. Para a caracterização de uma cidade inteligente nove variáveis devem ser observadas, quais sejam: capital humano, coesão social, economia, meio ambiente, governança, planejamento urbano, alcance internacional, tecnologia e mobilidade/transporte. Nesse passo, uma vez presentes tais elementos caracterizadores, é possível concluir que smarty city é um centro urbano que busca melhorar o seu desempenho através da utilização de dados, informações e recursos tecnológicos, através do monitoramento e otimização da infraestrutura existente, tendo por objetivo precípuo a prestação de serviços mais eficientes que maximizem o bem-estar da população. Vale ressaltar que a tecnologia não pode ser vista como um fim em si mesmo, mas deve ser utilizada em prol do gerenciamento de todas as variáveis supracitadas, cujo fim é o alcance do bem-estar da população, através de cidades tecnologicamente sustentáveis. Ademais, vale frisar que tal conceito se caracteriza por ser um modelo onde a conectividade é fonte de desenvolvimento a partir da utilização da infraestrutura de redes para melhorar a eficiência econômica e política e permitir o desenvolvimento social, cultural e urbano.
Em um segundo momento, é importante frisar que um importante passo foi dado rumo à regulamentação para implantação das smart cities em nosso país, qual seja, a aprovação pela Câmara de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei nº 976/21, que institui a Política Nacional das Cidades Inteligentes. Tal Política apresenta, dentre outros assuntos, requisitos, princípios, diretrizes, objetivos e a necessidade de elaboração de um Plano Municipal de Cidades Inteligentes que deverá ser aprovado por Lei Municipal e elaborado em consonância com o Plano Diretor Municipal. Todavia, um importante assunto não se encontra abarcado na Política Nacional das Cidades Inteligentes, qual seja, a existência um sistema de tributação que se coadune com a implantação de cidades inteligentes.
Objetivando demonstrar a importância a tributação como instrumento desenvolvimento e fonte de custeio das cidades inteligentes, o presente trabalho se utiliza dos ensinamentos sobre desenvolvimento socioeconômico do economista austríaco Joseph Schumpeter. Em análise à realidade brasileira, é possível perceber que o desenvolvimento econômico nacional encontra obstáculos na própria atuação estatal, pois, com o advento do Estado Social a missão de governar abarcava também a elaboração de um planejamento com a implantação de metas. Relembrando as premissas preconizadas pela teoria Schumpeteriana, é importante frisar que o desenvolvimento socioeconômico depende da combinação de diversas variáveis, dentre elas, o sucesso de uma Política Industrial. Todavia, para que tal política alcance êxito, é imprescindível que o Estado coordene diversos instrumentos, incluindo a implantação de metas, introjeção tecnológica, estratégias voltadas à exportação, priorização da infraestrutura e da alta tecnologia, bem como, um cenário fiscal e tributário favorável. Desta maneira, a falta de postura ativa do Estado na coordenação das políticas setoriais inviabiliza a busca pelo desenvolvimento socioeconômico.
Neste sentido, se justifica a necessidade de aprovação da Política Nacional de Cidades Inteligentes, para seja possível alavancar o seu desenvolvimento através da análise de objetivos, diretrizes e metas gerenciadas pelo Estado que visem o atendimento dos seus elementos caracterizadores. Logo, a implantação e o desenvolvimento de uma cidade inteligente, mediante o cumprimento dos seus elementos, requer uma fonte de custeio para satisfação das necessidades públicas, destacando-se os tributos como a principal delas. Todavia, o sistema tributário brasileiro atual não é receptivo ao cenário desenvolvimentista.
O Sistema Tributário Nacional é constituído por inúmeras legislações tributárias infraconstitucionais de alta complexidade que se encontra amparada na repartição de competências entre os entes federativos. Logo, nos deparamos no cotidiano tributário nacional com inúmeras regras tributárias federais, estaduais e municipais que objetivam regulamentar a relação jurídico-tributária existente entre contribuinte/responsável (sujeito passivo) e Fisco (sujeito ativo). De outro lado, a onerosidade decorre da carga tributária brasileira e da regressividade do Sistema Tributário, calcado na tributação sobre o consumo. Logo, ante à onerosidade e complexidade, é possível perceber que o Sistema Tributário atual não se demonstra receptivo, sendo um óbice ao desenvolvimento, sobretudo das cidades inteligentes.
Desta maneira, o país clama pela reforma do atual Sistema Tributária. Todavia, nunca se verificou qualquer alteração estrutural que solucionasse todos os problemas e críticas que o permeiam. A partir do ano de 2019, após à aprovação da Reforma da Previdência, o discurso sobre a alteração do Sistema Tributário Brasileiro foi intensificado através da apresentação de alguns projetos de Reforma Tributária. Em análise aos projetos em tramitação atualmente, é possível perceber que nenhum deles, de modo efetivo, resolve os problemas estruturais existentes na Sistema Tributário Nacional. Em um primeiro momento, a carga tributária não sofre redução. Em um segundo momento, alguns dos projetos se atentam somente para a simplificação, através da unificação tributária. Em um terceiro momento, os atuais projetos de reforma tributária demonstram uma conduta legislativa pela busca da implantação do tributo único, encontrando um óbice jurídico relevante no pacto federativo. Desta maneira, tais projetos somente protelam uma eficaz e estrutural alteração do Sistema Tributário Brasileiro e ensejam, consequentemente, a manutenção do mesmo cenário de ausência de receptividade para o desenvolvimento socioeconômico.
Nessa toada, visando apresentar a tributação como instrumento de desenvolvimento socioeconômico e fonte de custeio das cidades inteligentes surge como protagonista a extrafiscalidade. Em que pese os tributos se caracterizem como a principal fonte de arrecadação e de receitas do Estado foram reconhecidas outras funções aos mesmos, quais sejam: a) função distributiva; b) função indutora; e c) função simplificadora. A função distributiva é caracterizada pela repartição entre os contribuintes das necessidades financeiras do Estado. A função indutora consistente na tentativa de induzir determinado comportamento do contribuinte, ora incentivando-o a adotar determinada conduta, ora desestimulando-o a adotar determinada conduta indesejada. Já a função simplificadora se pauta no aumento da racionalidade e simplificação do sistema.
Em análise ao atual sistema de tributário encontramos diversos institutos que podem ser utilizados como instrumentos extrafiscais, dispostos na Constituição Federal de 1988 e nas legislações tributárias infraconstitucionais, quais sejam: imunidades, isenções, incentivos fiscais (reduções de alíquota ou base de cálculo, concessão de créditos tributários, regimes diferenciados, diferimentos, dentre outros) e princípios tributários. Desta maneira, levando-se em consideração que todo tributo possui, em maior ou menor intensidade, uma função indutora, cujo objetivo é estimular ou desestimular o comportamento do contribuinte para atendimento de uma finalidade almejada, foi possível analisar um cenário de tributação mais receptivo às cidades inteligentes, sobretudo, no tocante ao fomento de suas variáveis caracterizadoras.
Todo tributo, embora detentor de um contexto arrecadatório, possui uma função indutora. Desta maneira, é plenamente possível verificar que os tributos quando vistos pelo prisma da extrafiscalidade podem atuar como poderoso instrumento de desenvolvimento e fonte de custeio das cidades inteligentes, fomentando, sobretudo, os seus elementos caracterizadores.
Diante do exposto, é possível concluir que o cenário de tributação atual não pode ser visto como um instrumento de desenvolvimento, ante a ausência de receptividade caracterizada pela sua onerosidade e complexidade. Todavia, para que a tributação se torne receptiva, sobretudo, ao desenvolvimento das cidades inteligentes não há necessidade de profundas alterações estruturais no sistema tributário atual. A utilização da função indutora de cada tributo permite estimular ou desestimular um comportamento do contribuinte e, desta maneira, torna a tributação um instrumento de desenvolvimento econômico e fonte de custeio das cidades inteligentes através do fomento de seus elementos caracterizadores.Texto completo:
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