LIMITES INTERPRETATIVOS DOS CONTRATOS DE COLABORAÇÃO EMPRESARIAL

PEDRO FRANCO DE LIMA

Resumo


OBJETIVOS DO TRABALHO

 

 A ideia da pesquisa surge a partir da percepção da existência de uma ampla gama de normas passíveis de serem aplicadas a uma mesma relação jurídica privada interempresarial por parte dos intérpretes, as quais podem revelar um cenário de extrema insegurança jurídica e gerador de externalidades negativas ao mercado.

Assim objetiva-se identificar as particularidades dos contratos empresariais, em especial, dos contratos de colaboração e a existência ou não de limites interpretativos.

 

METODOLOGIA UTILIZADA

 

O método escolhido foi a abordagem qualitativa com pesquisa bibliográfica, mediante revisão de artigos científicos, doutrina e legislação selecionada com ênfase no período após 2002 em que houve a instituição do Cdigo Civil e período de elaboração de outras legislações que regulamentam os contratos empresariais.

 

REVISÃO DE LITERATURA

 

 Para atingir os objetivos o artigo a ser desenvolvido será dividido em três capítulos: (i) contratos de colaboração; (ii) autonomia dos contratos empresariais; (iii) o empresário economicamente dependente e a interpretação contratual restrita ao ethos empresarial.

No primeiro capítulo buscar-se-á identificar o que é um contrato de colaboração e as principais modalidades inseridas nessa classificação, quais sejam: contrato de distribuição, contrato de franquia e contrato de concessão comercial.

Contratos de colaboração mercantil se inserem no ramo do direito comercial, com uma especificidade das relações que são estabelecidas por atores profissionais. Esse elemento juntamente com a igualdade entre as partes são os pressupostos que marcam as relações comerciais. (LUPI, 2019, p.42)

Para que um contrato de distribuição possa existir é preciso uma cumulatividade de requisitos, a começar pelas atribuições de cada contratante: (i) De um lado deve estar o fabricante e do outro o encarregado pela revenda da mercadoria; (ii) A compra e venda entre os contratantes precisa ser contínua e pautada por vantagens diferenciadas ao distribuidor; (iii) O produto vendido deve ser fabricado pelo fornecedor e destinado ao distribuidor com a finalidade de revenda em uma área delimitada que não necessariamente precisa ser exclusiva; (iv) Apesar do distribuidor ser responsável por seu negócio, precisa observar padrões de qualidade definidos pelo sistema do fabricante. (DUFLOTH; PERIM, 2017, p.3-4)

Quanto ao contrato de franquia, também modalidade colaborativa, é regulado pela Lei 13.966 de 2019, sendo que os vetores de boa-fé e colaboração são elementos essenciais também neste tipo contratual, gerando para os contratantes deveres além do objeto principal, mas que se somam para que a relação seja de confiança e longa cooperação para possibilitar o alcance das legítimas expectativas. Tais deveres acessórios não precisam de expressa previsão contratual e vinculam os contratantes para além dos registros formais, são “obrigações que transcendem os limites formais do ajuste” (BEZERRA JÚNIOR, 2014, p.6484-6485)

Por outro lado, o contrato de concessão comercial, que tem por objeto a revenda de veículos, revenda dos componentes e prestação de assistência técnica, também possui Lei específica que o rege, conhecida como Lei Ferrari nº 6.729/79. (BRASIL, 1979)

A Lei Ferrari prevê que o contrato de concessão defina área operacional do concessionário (distribuidor) e distâncias mínimas entre estabelecimentos de concessionários – art. 5º. Os direitos e deveres dos contratantes são expressamente definidos dos arts. 6º a 15. (BRASIL, 1979)

O segundo capítulo investigará as características específicas dos contratos empresariais e analisará quais destas especificidades os diferencia dos demais tipos contratuais de modo a identificar a necessidade de restringir e definir limites da interferência estatal no tocante a interpretação e revisão contratual.

Os contratos de colaboração, modalidade de contratos empresariais, conforme analisado no tópico anterior, são instrumentos que vinculam partes empresariais que possuem interesse de cooperação para o alcance de benefícios comuns.

Observando as peculiaridades inerentes ao direito empresarial e compreendendo que a interpretação destes contratos deve conferir previsibilidade e segurança aos contratantes como forma de otimizar o funcionamento do mercado, Paula Forgione (2010, p.222) analisa as regras de Pothier que orientam a atividade interpretativa dos negócios empresariais.

A primeira regra evidencia que a intenção comum dos contratantes prevalece sobre o sentido gramatical: “Nas convenções mais se deve indagar qual foi a intenção commun das partes contrahentes, do que qual he o sentido gramatical das palavras” (FORGIONE, 2009, p.222). Sobre a primeira regra Paula Forgione (2009, p.222-223) explica que o intento comum é a causa objetiva relacionada aos usos e costumes comerciais, aquilo que normalmente espera-se com a contratação de modo geral.

A segunda regra de interpretação se relaciona com os efeitos contratuais: “Quando huma clausula he susceptível de dous sentidos, deve entender-se naquelle, em que ella pode ter efeito; e não naquelle, em que não teria effeito algum”. Assim analisa a autora que todo o contrato possui uma função econômica que é a sua causa, e a interpretação deve observá-la sob pena de, negando sua função típica, torná-lo inútil. (FORGINE, 2009, p.223)

A terceira regra caminha no mesmo sentido, indicando que os termos do contrato que forem passíveis de mais de um sentido também interpreta-se conforme a natureza contratual: “Quando em hum contrato os termos são susceptíveis de dous sentidos, devem entender-se no sentido que mais convém à natureza do contrato”. (FORGIONE, 2009, p.223)

Necessário realçar que o reconhecimento das particularidades do direito empresarial não significa a desproteção dos empresários economicamente dependentes. Nos casos específicos onde a existir um grau elevado de dependência ou assimetria entre as partes a interpretação contratual apesar de ocorrer dentro do ethos empresarial, garantirá de igual modo a dignidade empresarial.

Assim, será analisado de que forma poderá se proteger o contrato e a lógica utilitarista do sistema empresarial e ao mesmo tempo garantir segurança e previsibilidade aos contratantes sem precisar recorrer a soluções interpretativas alocadas fora da lógica comercial inclusive quando a simetria não se fizer presente.

O terceiro capítulo objetiva verificar se a existência da limitação interpretativa também deve ser aplicada nos casos de dependência econômica e assimetria informacional, situações fáceis de serem vislumbradas nos contratos de colaboração.

Conforme foi analisado o direito comercial/empresarial é um ramo do direito que possui nuances específicas que nos permite distingui-lo dos demais. Tratando-se de contratos empresariais suas características ressaltam as diferenças que possuem com relação as partes e a lógica dos sistemas cível e consumerista.

A dependência econômica, normalmente é vislumbrada no contratos de colaboração, os quais usualmente também são denominados de contratos de dependência. Segundo analisa Coelho (apud DASSAN, 2020, p.112) a dependência acontece quando uma empresa tem o dever de observar regras organizacionais de outra o que acaba limitando a liberdade de condução do negócio e operando certo domínio de uma sobre a outra como acontece por exemplo entre franqueados e franqueadores.

Apesar de em alguns contratos a dependência ser inerente à forma de contratação escolhida e por isso a proteção do empresário dependente ser uma preocupação legal, em alguns casos ao longo da relação contratual ocorre o aumento da dependência, situação que exige saídas jurídicas. Para isso o art. 473 do Código Civil traz norma que trata da resilição unilateral visando equilibrar a relação interempresarial. (FORGIONI apud DASSAN, 2020, p.113)

Ainda, as normas previstas pelos arts. 421 a 425 do Código Civil, assim como o art. 113 do diploma civilista que trazem regramentos para os contratos em geral, são aptos a resguardar a função econômica dos contratos sem a necessidade de recorrer ao Código de Defesa do Consumidor pois estabelecem princípios e exigem o cumprimento de deveres que resguardam os usos e costumes, as expectativas dos contratantes, protegem o aderente nos contratos de adesão, privilegiando a liberdade de contratar e a boa-fé objetiva. (OLIVEIRA FILHO; DEZEM, 2019, p.127)

Apresenta-se também de importante atenção aos intérpretes jurídicos que a teoria da imprevisão do art. 478 do Código Civil deve ser avaliada com extrema cautela no âmbito empresarial pois nem sempre a redução do lucro empresarial significará uma onerosidade excessiva já que os riscos negociais são inerentes ao sistema. (OLIVEIRA FILHO; DEZEM, 2019, p.138)

Portanto percebe-se através das normas citadas que não se pode aplicar o instituto da onerosidade excessiva aos contratos empresariais de forma automática sem observar os aspectos especiais do direito comercial, assim como que a área comercial/empresarial fornece caminhos autônomos na solução dos conflitos.

 

RESULTADOS OBTIDOS OU ESPERADOS

 

A partir da análise dos dados coletados será possível verificar se efetivamente existem soluções interpretativas que garantem efetividade aos contratos, segurança jurídica, preservação do mercado e proteção aos empresários economicamente dependentes sem a necessidade de recorrer a institutos de outros campos do direito e consequentemente sem corromper a lógica específica do direito empresarial.

 

TÓPICOS CONCLUSIVOS

 

A verificação do conceito de contratos de colaboração e as principais modalidades inseridas nessa classificação, assim como a análise das características específicas dos contratos empresariais e a observação dos limites interpretativos a partir do estudo doutrinário e legislativo poderá permitir o reconhecimento de que efetivamente existe uma autonomia deste campo do direito que orienta qual o grau adequado de interferência estatal no âmbito das relações privadas empresariais.

Através do estudo prévio verificou-se que a doutrina não pretende defender o posicionamento de que o contrato interempresarial não possa ser discutido. Porém, se houver a necessidade de intervenção estatal, essa deverá ser realizada através das regras específicas do âmbito comercial empresarial, bem como que as soluções dadas ao caso concreto deverão adequar-se a lógica deste sistema e de suas especificidades, a começar pelo reconhecimento de que as partes contratantes são profissionais em uma relação presumidamente simétrica.


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Referências


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Lei 6.729 de 28 de novembro de 1979. Dispõe sobre a concessão comercial entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre;

BEZERRA JÚNIOR, Luis Martius Holanda. O contrato de franquia e a violação dos deveres anexos de conduta: A boa-fé como fronteira de atuação das partes (da culpa in contrahendo à culpa post pactum finitum). Ano 3 (2014), nº 9, p. 6465-6535 / http://www.idb-fdul.com/ ISSN: 2182-7567;

DASSAN, Lucas Amaral. Contratos interempresariais: autonomia sistêmica do regime jurídico e seus efeitos na concretização do direito empresarial. Orientador: André Lipp Pinto Basto Lupi. 2020. 148f. Dissertação (mestrado) – Direito Empresarial e Cidadania da Unicuritiba. Curitiba, 2020;

DUFLOTH, Rodrigo. PERIM, Paula Abi-Chahine Yunes. Contratos de distribuição: questões controversas e tentativa de sistematização. Revista de Direito Recuperacional e Empresa/ Vol. 5/2017 / Jul – Set / 2017 DRT/2017/5716.

FORGIONI, Paula A. Teoria Geral dos Contratos Empresariais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2009;

LUPI, André Lipp Pinto Basto. Especialização Funcional do Direito Comercial: estudo da autonomia do Direito Comercial. Rev. Fac. Dir. | Uberlândia, MG | v.47 | n.1 | pp. 39-60 | jan./jun. 2019 | ISSN 2178-0498. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/49644. Acesso em: 01 mar.2021;

OLIVEIRA FILHO, Paulo Furtado; DEZEM, Renata Mota Maciel Madeira. Os reflexos da interpretação dos contratos empresariais pelo Poder Judiciário. Cadernos Jurídicos da Escola Paulista da Magistratura, São Paulo, ano 20, nº 50, p. 123-141, Julho-Agosto/2019. Disponível em:. Acesso em: 29 jun. 2021;




DOI: http://dx.doi.org/10.21902/RevPercurso.2316-7521.v3i41.5534

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PERCURSO, e-ISSN: 2316-7521

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