FUNDOS DE INVESTIMENTO E LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA: ASPECTOS RELEVANTES REGULAMENTADOS PELA CVM

ARICK MENDES

Resumo


OBJETIVOS DO TRABALHO

 

O presente estudo objetiva analisar quais são os aspectos relevantes sobre os fundos de investimento, regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários, haja vista as inovações incorporadas ao Código Civil Brasileiro pela Lei da Liberdade Econômica. Para tanto, analisa as propostas apresentadas pela CVM em Audiência Pública SDM 08/20, acordando os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) e os impactos ocasionados pela Lei no 13.874/2019, traçando panorama sobre a Lei da Liberdade Econômica e os impactos por ela gerados, principalmente, aos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios. Desse modo, o trabalho se propõe à análise da proposta de regulamentação apresentada pela CVM, com foco nos aspectos patrimoniais dos fundos de investimento e de seus cotistas, abordando as inovações sobre: (i) responsabilidade dos cotistas; (ii) classes de cotas com segregação patrimonial; (iii) aplicação do instituto da insolvência civil aos fundos de investimento de responsabilidade limitada e com insuficiência de patrimônio.

 

METODOLOGIA UTILIZADA

 

Observa-se que o método aplicado à investigação na pesquisa realizada foi o dedutivo. A abordagem que se dá é qualitativa, desenvolvendo-se por meio de pesquisa bibliográfica e documental a respeito da temática proposta, o que permite trazer conclusões sobre o aspecto patrimonial dos fundos de investimentos e de seus cotistas.

 

REVISÃO DE LITERATURA

 

Em que pese terem existido diversas alterações ao longo do tempo, hodiernamente, verifica-se que a regulamentação sobre os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) ainda se mantêm por meio da Instrução CVM no 356. Contudo, nos últimos anos, a atividade empresarial teve alguns aspectos tratados de forma mais peculiar pelo legislador, principalmente em razão das circunstâncias que eram observadas no cenário nacional:

 

[...] um período marcado por uma superposição e irracionalidade no controle estatal da atividade econômica e por índices pouco favoráveis na economia brasileira, marcados pelos níveis de desemprego elevados, o baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), os números crescentes de emigração provocados pela insatisfação com a economia brasileira e com o futuro do país, os custos de transação para o desempenho de uma atividade empreendedora em patamares desanimadores dentre outras circunstâncias adversas. (ARAUJO, 2019, p. 40)  

 

A Lei da Liberdade Econômica inseriu dispositivo, no Código Civil, que permitiu que o regulamento do fundo de investimento estabeleça:

 

I - a limitação de responsabilidade de cada investidor ao valor de suas cotas;

II - a limitação da responsabilidade, bem como parâmetros de sua aferição, dos prestadores de serviço do fundo de investimento, perante o condomínio e entre si, ao cumprimento dos deveres particulares de cada um, sem solidariedade;

III - classes de cotas com direitos e obrigações distintos, com possibilidade de constituir patrimônio segregado para cada classe”. (BRASIL,2002)

 

Sobre esses aspectos, a exposição de motivos da minuta apresentada pela CVM se mostrou atenta às novas possibilidades de estruturação de fundos, salientando, contudo, que, em que pese o Código Civil permitir a estruturação mais flexível dos fundos de investimento, tais possibilidades não são obrigatórias, de modo que “remanesce a possibilidade de utilização de estruturas mais tradicionais do mercado brasileiro”. (COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, 2021).

Sobre a possibilidade de limitação da responsabilidade dos investidores ao valor de suas cotas, conforme preconizada no art. 1.368-D, I, do Código Civil, a Minuta da Resolução apresentada pela CVM em audiência pública SDM 08/20, ao tratar sobre a temática do regulamento dos fundos de investimento, preconiza que será o regulamento que regerá o fundo, todavia, caso haja classes de cotas, estas deverão ser regidas por anexos ao regulamento principal. Na exposição de motivos, afirma-se que sobre tal temática, “a lei buscou implementar uma blindagem eficiente para os investidores”. (BRASIL, 2019).

A respeito da segregação patrimonial das cotas, o artigo 44, §1o, V da Resolução apresentada em Minuta pela CVM, determina que deverá ser disposto no regulamento do fundo se este contará com classe única de cotas ou com diferentes classes (COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, 2021). Observando-se que, caso haja criação de novas classes, estas deverão ser registradas na CVM durante o funcionamento do fundo, de acordo com o que preconiza o art. 7o, §2o da Resolução.

Sobre a temática da aplicabilidade do instituto da insolvência civil aos fundos com patrimônio líquido negativo, a CVM demonstra ter ciência de que, haja vista o artigo 1.368-E, do Código Civil, dispor a respeito da insolvência do fundo de investimento, verifica-se o seguinte problema:

 

Embora a Minuta permita que o fundo tenha patrimônios segregados entre diferentes classes de cotas, a princípio, um pedido de declaração judicial de insolvência não alcançaria somente determinada classe, com relação à qual o problema se materializasse, mas todas as classes do fundo. Tal questão é relevante por dois motivos:

I. a LLE estabeleceu a possibilidade de que a cada classe de cotas corresponda a um patrimônio segregado, de modo que o fato de o patrimônio líquido de uma única classe de cotas estar negativo não deveria repercutir diretamente para as demais classes; e 

II. não obstante, o fato de o fundo ser o objeto da declaração de insolvência em tese aumenta a probabilidade de o Poder Judiciário, ao analisar o caso concreto, considerar que a declaração de insolvência derivada de uma única classe de cotas deve de algum modo impactar o patrimônio relativo a outras classes do fundo. (COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, 2021)

 

 

RESULTADOS OBTIDOS OU ESPERADOS:

 

Em primeiro momento, compreendeu-se que as circunstâncias fundamentais à criação da Lei da Liberdade Econômica se deram, principalmente, com o objetivo de elevar o potencial nacional para desenvolvimento de atividade empresarial. Em outros termos, as péssimas colocações em rankings internacionais sobre a realização de negócios tiveram forte importância para o advento da normativa supracitada.

A Lei da Liberdade Econômica, ao abordar diversas temáticas, trouxe alterações ao Código Civil Brasileiro que implicaram em inovação normativa a respeito do gênero fundos de investimento, do qual os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios são espécie. Observou-se a importância e conveniência da proposta apresentada pela CVM em Audiência Pública SDM 08/20 no sentido de inovar a regulamentação dos fundos de investimento.  

 

TÓPICOS CONCLUSIVOS

 

Por meio de análise da proposta de regulamentação aos Fundos de Investimento, apresentada pela CVM, e que tratam de aspectos patrimoniais, tanto dos fundos de investimento, quanto de seus cotistas, pode-se concluir que, em razão da relevância da temática, ainda há necessidade de definições pormenorizadas na normativa apresentada por parte da Comissão de Valores Mobiliários, principalmente no sentido de aventar à possibilidade de pedido de insolvência civil somente à classe de cota que tenha patrimônio líquido negativo.

Inobstante a necessidade de segurança jurídica como consequência de bem estruturada normativa, por parte da CVM a respeito de peculiar temática, há que se salientar à possibilidade de, em caso de judicialização de questões que envolvam o pedido de declaração de insolvência civil de fundos de investimentos, pode o julgador fazer uso de interpretação teleológica, ampliando o sentido da lei (que se refere à insolvência do fundo) para, em observância aos objetivos notadamente liberais da Lei da Liberdade Econômica, bem como da regulamentação dos fundos de investimento proposta pela CVM, permitir que seja declarada a insolvência civil somente à classe do fundo de investimento que, de fato, detenha patrimônio líquido negativo.

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Referências


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DOI: http://dx.doi.org/10.21902/RevPercurso.2316-7521.v3i41.5531

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